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terça-feira, 8 de agosto de 2017

Afinal, pode o Delegado de Polícia dispensar a fiança do autuado?

Por Bruno Taufner Zanotti e Cleopas Isaías Santos

Reconhecendo que em um Estado Constitucional a liberdade é a regra, o constituinte originário estabeleceu que “ninguém será levado à prisão ou nela mantido, quando a lei admitir a liberdade provisória, com ou sem fiança” (CF, art. 5º, inc. LXVI). Desse modo, nenhuma autoridade poderá prender (recolher à prisão) ou manter preso um cidadão quando a liberdade provisória for possível.

Diante dessa regra, o legislador da recente reforma das medidas cautelares no Processo Penal pátrio tratou da matéria, inclusive indo além da regulamentação originária do Código de Processo Penal.

Com efeito, a fiança, antes da Lei nº 12.403/2011, era essencialmente uma medida de contracautela, cuja finalidade era restaurar a liberdade de locomoção de alguém preso em flagrante (art. 310, caput, inc III; art. 322, caput e par. único, todos do CPP).

Além disso, a competência (administrativa e jurisdicional) para arbitrá-la era estabelecida a partir da natureza da pena do crime que ensejou a prisão em flagrante. Se a pena fosse de detenção, a autoridade poderia estabelecê-la. Se de reclusão, somente ao juiz caberia arbitrá-la.

Com a reforma, além de sua originária natureza contracautelar, a fiança passou a ter também natureza de medida cautelar autônoma, alternativa à prisão, nos termos do novel art. 319, inc. VIII, do CPP.

Está com a razão, pois, Gustavo Badaró, ao afirmar que, “com a sistemática instituída pela Lei nº 12.403/2011, a fiança passou a ter natureza híbrida, podendo ser tanto uma medida cautelar autônoma, quanto uma contracautela à prisão”1.

Outra mudança que importa aqui destacar diz respeito ao novo critério diferenciador da competência para arbitrar a fiança, que deixou de ser a qualidade da pena e passou a ser a quantidade de pena.

Com efeito, a redação anterior do art. 322 do CPP previa que a autoridade policial poderia arbitrar a fiança nos crimes punidos com detenção ou prisão simples. Por outro lado, de acordo com a nova redação do art. 322 do CPP, “A autoridade policial somente poderá conceder fiança nos casos de infração cuja pena privativa de liberdade máxima não seja superior a 4 (quatro) anos. Parágrafo único. Nos demais casos, a fiança será requerida ao juiz, que decidirá em 48 (quarenta e oito) horas”.

A primeira ressonância da nova regulamentação, na atividade do delegado de polícia, foi a ampliação do leque de crimes afiançáveis pela autoridade policial, já que a grande maioria dos crimes punidos com detenção possuem pena máxima em abstrato de até 3 (três) anos. No Código Penal, por exemplo, apenas um crime é punido com pena de detenção maior que 4 (quatro) anos, que é o infanticídio (art. 123), cuja pena máxima em abstrato é de 6 (seis) anos de detenção. Neste caso, o delegado de polícia não mais poderá arbitrar a fiança.

A Lei nº 12.403/2011 resolveu elencar os crimes inafiançáveis, os mesmos já previstos na Constituição Federal, agora de forma sistemática.

Assim, nos termos do art. 323, são inafiançáveis os seguintes crimes: a) racismo; b) tortura; c) tráfico ilícito de entorpecentes e drogas afins; d) terrorismo; e) crimes hediondos; f) crimes cometidos por grupos armados, civis ou militares, contra a ordem constitucional e o Estado Democrático. Nestas hipóteses, a inafiançabilidade é absoluta, por ser em razão da natureza do crime.

Além dessas hipóteses, o legislador descreveu outras que, embora se tratando de crimes afiançáveis, algumas circunstâncias o tornam inafiançáveis. São hipóteses que poderíamos chamar de inafiançabilidade relativa ou circunstâncias de inafiançabilidade.

Tais circunstâncias estão previstas no art. 324 do CPP, a saber: a) quebra, no mesmo processo, da fiança anteriormente concedida; b) descumprimento, sem justo motivo, de qualquer das obrigações previstas nos arts. 327 e 328 do CPP; c) nos casos de prisão civil ou militar; e d) quando estiverem presentes os motivos que autorizam a decretação da prisão preventiva.

Excluídas as hipóteses de inafiançabilidade anteriormente referidas, e sendo o crime punido com pena máxima em abstrato de até 4 (quatro) anos, o delegado de polícia, após a lavratura do respectivo auto de prisão em flagrante, arbitrará a fiança ao autuado, desde de que, por óbvio, não estejam presentes os motivos que justificam a prisão preventiva (art. 324, inc. IV, do CPP).

O valor da fiança arbitrada pela autoridade policial poderá variar de 1 (um) a 100 (cem) salários mínimos, nos termos do art. 325, inc. I, do CPP.

Para determinar o valor exato a ser arbitrado, o delegado de polícia levará em consideração, segundo o que dispõe o art. 326, do CPP: a) a natureza da infração; b) as condições pessoais de fortuna e vida pregressa do autuado; c) as circunstâncias indicativas de sua periculosidade; e d) o provável valor das custas processuais.

A depender das condições econômicas do autuado, o delegado de polícia poderá, nos termos do art. 325, § 1º, do CPP: a) reduzir a fiança até o máximo de 2/3 (dois terços); aumenta-la até 1000 (mil) vezes; ou c) dispensá-la.

Sobre a dispensa da fiança, é importante destacar que a disciplina do art. 326, § 1º, inc. I, do CPP, faz expressa referência ao art. 350 do CPP, o qual, por sua vez, refere-se apenas ao juiz, e não ao delegado de polícia, como autoridade que pode dispensar a fiança. Diante disso, questiona-se: afinal, pode a autoridade policial dispensar a fiança, quando as condições econômicas do autuado assim recomendarem?

A doutrina diverge sobre o tema. Vidal Gomes (2011, p. 467), por exemplo, entende que somente o juiz pode dispensar a fiança. Assim, nas palavras desse autor, “quanto à dispensa da fiança na hipótese prevista no art. 350 do Código de Processo Penal, a competência para sua concessão neste caso é apenas do juiz, conforme expressamente disposto”2.

Outro não é o entendimento de Estulano Garcia e Estulano Pimenta (2009, p. 107). Segundo estes doutrinadores, “afiançável o crime, se o réu não tiver condições de pagar a fiança, por ser juridicamente pobre, poderá ser concedida liberdade provisória sem fiança, mas com as vinculações próprias da fiança. Mas somente o juiz poderá conceder a liberdade provisória”3.

Não obstante o magistério de tão significativos doutrinadores do direito policial, pensamos de modo diverso. Entendemos que o art. 350 do CPP deve ser aplicado, por analogia, como autorizado pelo art. 3º do mesmo código, tudo com o fim de dar maior eficácia aos direitos fundamentais do imputado.

O respeito aos direitos fundamentais do cidadão é dever de toda autoridade e seus agentes, não havendo espaço imune a suas ressonâncias. Partindo dessa premissa, não haveria qualquer razão, lógica ou jurídica, para que o delegado de polícia fosse impedido de dispensar a fiança, quando a situação econômica do autuado assim recomendasse, mas estivesse autorizado a aumentá-la e reduzi-la. Pensar de outro modo seria reforçar, ilegitimamente, a já institucionalizada seletividade penal, onde quem pode pagar, livra-se solto, e quem não pode, permanece preso, embora seja possível a concessão de liberdade provisória, independente de fiança, e até mesmo mediante a aplicação de outras medidas cautelares alternativas ao cárcere. De todo modo, a hipossuficiência do autuado não pode ser soterrada, mormente quando evidente a desnecessidade da manutenção de sua prisão.

Na mesma linha, Flaviane Barros e Felipe Machado (2011, p. 72-73) 4, assim se manifestarem sobre o tema: “Tendo em vista a compreensão de que o juiz não é o único intérprete autorizado do direito (HÄBERLE, 1997), bem como o fato de a interpretação acerca da privação da liberdade do cidadão deve ser sempre mais favorável à conservação do status libertatis, tem-se que a autoridade policial poderia conceder liberdade provisória, com a respectiva dispensa da fiança, nos termos do art. 350 do CPP. Ademais, tem-se que a miserabilidade do cidadão não pode impingir-lhe a prisão por mais tempo do que ocorreria em se tratando de um cidadão rico”.

Para André Nicolitt (2014, p. 797-798): “A prisão em flagrante destina-se à sua conversão em prisão preventiva. Em caso de pena não superior a 4 anos, o juiz não poderia decretar a prisão, não sendo razoável recolher o indiciado ao cárcere até que o juiz o isente do recolhimento, nos termos do art. 350 do CPP. Por tal razão, sustentamos que a própria autoridade policial poderá dispensar a fiança e colocar o réu em liberdade”.

Assim, o delegado de polícia poderá dispensar a fiança e conceder liberdade provisória ao autuado, se assim recomendar sua condição econômica, devendo fazê-lo em despacho fundamentado. Entretanto, ao fazer isso, a autoridade policial imporá ao autuado as obrigações previstas nos arts. 327 e 328 do CPP (MARCÃO, p. 749-750)5.

Atendo a esse entendimento, o 1º Congresso Jurídico dos Delegados da Polícia Civil do Estado do Rio de Janeiro, realizado nos dias 17 e 18 de novembro de 2014, editou o Enunciado nº 6, com o seguinte teor: “o delegado de polícia poderá, mediante decisão fundamentada, dispensar a fiança do preso, para não recolhimento ao cárcere do indiciado pobre”.

Na hipótese de a autoridade policial se recusar ou retardar a conceder a fiança, haverá constrangimento ilegal, podendo o autuado, ou alguém em seu lugar, prestá-la, por simples petição, junto ao juiz competente, o qual terá o prazo de 48 (quarenta e oito) horas para decidir, nos termos do art. 335 do CPP. O momento ideal para essa decisão é a audiência de custódia.

Notas e Referências:

1 BADARÓ, Gustavo Henrique. Medidas cautelares alternativas à prisão preventiva: comentários aos artigos 319-350 do CPP, na redação da Lei 12.403/2011. In: FERNANDES, Og. Medidas cautelares no processo penal: prisões e suas alternativas. São Paulo: RT, 2011, p. 258. Para NICOLITT, André. Manual de processo penal. São Paulo: RT, 2014, p. 794, a fiança concedida pelo Delegado de polícia não possui natureza de medida cautelar ou contracautelar, mas de garantia real, ou seja, natureza civil/administrativa.

2 GOMES, Amintas Vidal. Manual do delegado: teoria e prática. 6. ed. Revista e atualizada por Rodolfo Queiroz Laterza. Rio de Janeiro: Forense, 2011.

3 GARCIA, Ismar Estulano; PIMENTA, Breno Estulano. Procedimento policial: inquérito policial e termo circunstanciado. Goiânia: AB, 2009.

4 BARROS, Flaviane de Magalhães; MACHADO, Felipe Daniel Amorim. Prisão e medidas cautelares. Belo Horizonte: Del Rey, 2011.

5 MARCÃO, Renato. Curso de processo penal. São Paulo: Saraiva, 2014, p. 749-750, entende não ser possível a aplicação das condições dos arts. 327 e 328 do CPP quando a fiança for dispensada por hipossuficiência econômica do autuado, já que a liberdade provisória sem fiança do abastardo não se vincula a tais condições. Segundo o autor, devem ser aplicadas as medidas cautelares dos arts. 319 e 320 do CPP que forem adequadas e necessárias.

terça-feira, 25 de julho de 2017

FIANÇA - Breves apontamentos

O QUE É FIANÇA?

            É uma garantia real prestada pelo acusado ou por terceiro destinada a assegura o cumprimento de uma obrigação.

EM QUE CONSISTE?

Art. 330.  A fiança, que será sempre definitiva, consistirá em depósito de dinheiro, pedras, objetos ou metais preciosos, títulos da dívida pública, federal, estadual ou municipal, ou em hipoteca inscrita em primeiro lugar.
§ 1o  A avaliação de imóvel, ou de pedras, objetos ou metais preciosos será feita imediatamente por perito nomeado pela autoridade.
§ 2o  Quando a fiança consistir em caução de títulos da dívida pública, o valor será determinado pela sua cotação em Bolsa, e, sendo nominativos, exigir-se-á prova de que se acham livres de ônus.

MOMENTO:

 Desde a prisão até o transito em julgado.

Art. 334.  A fiança poderá ser prestada enquanto não transitar em julgado a sentença condenatória. (Redação dada pela Lei nº 12.403, de 2011).

TERCEIRO PODE PRESTÁ-LA?

Sim.
Art. 335.  Recusando ou retardando a autoridade policial a concessão da fiança, o preso, ou alguém por ele, poderá prestá-la, mediante simples petição, perante o juiz competente, que decidirá em 48 (quarenta e oito) horas. (Redação dada pela Lei nº 12.403, de 2011).

QUAIS SÃO OS CRIMES INAFIANÇÁVEIS?

Art. 323.  Não será concedida fiança:
I - nos crimes de racismo;
II - nos crimes de tortura, tráfico ilícito de entorpecentes e drogas afins, terrorismo e nos definidos como crimes hediondos;
III - nos crimes cometidos por grupos armados, civis ou militares, contra a ordem constitucional e o Estado Democrático;
Art. 324.  Não será, igualmente, concedida fiança:
I - aos que, no mesmo processo, tiverem quebrado fiança anteriormente concedida ou infringido, sem motivo justo, qualquer das obrigações a que se referem os arts. 327 e 328 deste Código;
II - em caso de prisão civil ou militar;
 III - (revogado);
IV - quando presentes os motivos que autorizam a decretação da prisão preventiva (art. 312).

IMPORTANTE: O STF entendeu que no caso do Senador Delcídio do Amaral, embora os crimes praticados por ele não estejam no rol do crimes absolutamente inafiançáveis previstos no artigo 323. Toda vez que for cometido crime e estiverem presentes os requisitos da preventiva o crime será inafiançável.

VALOR DA FIANÇA:

Art. 325.  O valor da fiança será fixado pela autoridade que a conceder nos seguintes limites: (Redação dada pela Lei nº 12.403, de 2011).
I - de 1 (um) a 100 (cem) salários mínimos, quando se tratar de infração cuja pena privativa de liberdade, no grau máximo, não for superior a 4 (quatro) anos; (Incluído pela Lei nº 12.403, de 2011).
II - de 10 (dez) a 200 (duzentos) salários mínimos, quando o máximo da pena privativa de liberdade cominada for superior a 4 (quatro) anos. (Incluído pela Lei nº 12.403, de 2011).
 § 1o  Se assim recomendar a situação econômica do preso, a fiança poderá ser: (Redação dada pela Lei nº 12.403, de 2011).

I - dispensada, na forma do art. 350 deste Código; (Redação dada pela Lei nº 12.403, de 2011).
II - reduzida até o máximo de 2/3 (dois terços); ou (Redação dada pela Lei nº 12.403, de 2011).
III - aumentada em até 1.000 (mil) vezes. (Incluído pela Lei nº 12.403, de 2011).
§ 2o  (Revogado): (Redação dada pela Lei nº 12.403, de 2011). (Revogado pela Lei nº 12.403, de 2011).



QUEBRA DA FIANÇA:
Art. 341.  Julgar-se-á quebrada a fiança quando o acusado:
I - regularmente intimado para ato do processo, deixar de comparecer, sem motivo justo;
II - deliberadamente praticar ato de obstrução ao andamento do processo;
III - descumprir medida cautelar imposta cumulativamente com a fiança;
IV - resistir injustificadamente a ordem judicial;
V - praticar nova infração penal dolosa.
MACETE DE-DE-DE-RE-PRA.

DEixa de comparecer,
DEliberadamente obstrui o processo e
DEscumpri medida cautelar,
REsisti injustificadamente a ordem judicial
PRAtica nova infração DOLOSA.

REFORÇO DA FIANÇA

Art. 340.  Será exigido o reforço da fiança:

I - quando a autoridade tomar, por engano, fiança insuficiente;
II - quando houver depreciação material ou perecimento dos bens hipotecados ou caucionados, ou depreciação dos metais ou pedras preciosas;
III - quando for inovada a classificação do delito.
Parágrafo único.  A fiança ficará sem efeito e o réu será recolhido à prisão, quando, na conformidade deste artigo, não for reforçada.

 CASSAÇÃO DA FIANÇA:

 Concedida equivocadamente

Ocorre inovação da tipificação do delito antes imputado ao afiançado.

*os valores/bens são devolvidos.

Fonte: http://coracoesnasombras.blogspot.com.br/2016/03/fianca.html
"Posso ser leve como uma brisa ou forte como uma ventania,
Depende de quando e como você me vê passar."

Clarice Lispector