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quarta-feira, 12 de fevereiro de 2020

O sim é o descuido do não

Não me entenda mal, mas precisamos aprender a dizer "não". É uma questão de saúde mental, de qualidade de vida. É claro que devemos estar abertos a oportunidades. Mas precisamos dizer "sim" somente quando realmente quisermos dizê-lo.  É preciso existir o real desejo do assentimento ou quando ele não existir, a situação ser imperiosa a ponto de que o "sim" seja necessário, por questões que superam o seu estado físico ou psicológico daquele momento. Vivemos na era do automatizado e muitas vezes dizemos "sim" sem muita reflexão, somente para nos poupar de situações futuras, evitar desavenças ou incômodos naquele momento ou em seguida.

Mas a vida é feito da coleção de pequenos momentos e a cada "sim" que deveria ser dito "não", nossa vida vai se esvaindo, quando deveria estar fluindo.

Num mundo sombrio de egos inflados; dizer "não" para um convite, proposta ou solicitação pode soar como um desprestígio ou falta de empatia ou amizade. Mas não podemos esquecer jamais que nosso tempo é nosso maior ativo, devemos aprender a valorizar ele, pois o tempo não volta e não pode ser comprado. Podemos pensar: "não 'tô afim de fazer isso, mas se eu disser "não", ele(a) vai ficar magoado comigo". É um pensamento lógico, mas é preciso ser sopesado.

E, sinceramente, é normal que um amigo fique magoado e está tudo bem. Outro dia, pode ser ele a dizer não para você (tomará que não como forma de vingança). Veja, a vida é um misto de alegrias e dissabores, aprender a valorizar o seu tempo e a sua energia é uma questão literalmente de vida, de felicidade.  

Felicidade é a certeza de que a nossa vida não está se passando inutilmente. (Érico Veríssimo , Olhai os Lírios do Campo. Editora Globo, 1974)

Mas Roldan, tem gente que você oferece mão, ela pede o braço. Cuidado,  não estou me referindo a pessoas folgadas. Essas, quando detectadas, devem ser excluídas do "sim", caso contrário, elas irão aproveitar mesmo, sugando a energia vital de quem os ajuda.

Voltando ao assunto, talvez um cuidado a se tomar com seu amigo ou colega, seria dizer o "não" de uma forma educada: "Muito obrigado pelo convite, mas não posso ir" ou "Agradeço o convite, mas hoje não estou disposto". Não precisa mentir ou inventar uma história mirabolante. A verdade pode doer, mas liberta. Se a pessoa que recebeu o "não" te respeita e te valoriza, ela certamente irá entender, mesmo que fique chateado no momento.

Outra hipótese é delimitar o "sim" ou oferecer outra ajuda alternativa, caso você possa ou queira atender parcialmente o pedido, é claro. Exemplo: "Vamos na casa de fulano? Vamos sim, mas só posso ficar até as 22h, acordo cedo amanhã (se você sabe que seus amigos ficarão magoados se você sair mais cedo ou fizerem pressão psicológica para você ficar até tarde, então diga logo "não") ou o a seguinte situação:  "Fulano, você pode me ajudar a fazer esse relatório aqui do meu trabalho? - Poxa, queria muito, mas estou sem tempo. Vou te encaminhar um ótimo modelo de referência, qualquer dúvida pode me perguntar".

São exemplos genéricos e hipotéticos, a questão é demonstrar o seu respeito, carinho ou empatia pelo próximo. Você está dizendo "não" de uma forma polida e educada, e pode, quando possível sugerir outra forma de ajuda. Lembre-se: amanhã pode ser você a ter uma solicitação negada ou parcialmente atendida, então devemos procurar  sempre ser solícitos, educados e gentis. 

Eu não sei qual é o segredo do sucesso, mas  o segredo do fracasso é tentar agradar todo mundo" (Bill Cosby)

Veja, o autor da frase usa o verbo "tentar", obviamente é impossível agradar a todos ou agradar a mesma pessoa o tempo todo; e está tudo bem. Eu, por muito tempo, dificilmente dizia "não" e grande parte das vezes me coloca em situações e/ou lugares onde eu não queria estar ou lugares que me faziam mal.

Que possamos dizer "sim" para vida e principalmente para as coisas boas dela, pois às vezes, será necessário dizer "sim" para coisas não tão boas assim, mas que são necessárias ou urgentes. Isso é fato. Que o nosso "sim" seja sempre que possível um genuíno ato de vontade. Como diria Vinicius de Moraes: "a hora do sim é o descuido do não", será? 


Roldan Alencar

terça-feira, 15 de outubro de 2019

Definitivo | Martha Medeiros


Definitivo, como tudo o que é simples. Nossa dor não advém das coisas vividas, mas das coisas que foram sonhadas e não se cumpriram.

Sofremos por quê? Porque automaticamente esquecemos o que foi desfrutado e passamos a sofrer pelas nossas projeções irrealizadas, por todas as cidades que gostaríamos de ter conhecido ao lado do nosso amor e não conhecemos, por todos os filhos que gostaríamos de ter tido junto e não tivemos,por todos os shows e livros e silêncios que gostaríamos de ter compartilhado, e não compartilhamos. Por todos os beijos cancelados, pela eternidade.

Sofremos não porque nosso trabalho é desgastante e paga pouco, mas por todas as horas livres que deixamos de ter para ir ao cinema, para conversar com um amigo, para nadar, para namorar.

Sofremos não porque nossa mãe é impaciente conosco, mas por todos os momentos em que poderíamos estar confidenciando a ela nossas mais profundas angústias se ela estivesse interessada em nos compreender.

Sofremos não porque nosso time perdeu, mas pela euforia sufocada.

Sofremos não porque envelhecemos, mas porque o futuro está sendo confiscado de nós, impedindo assim que mil aventuras nos aconteçam, todas aquelas com as quais sonhamos e nunca chegamos a experimentar.

Por que sofremos tanto por amor? O certo seria a gente não sofrer, apenas agradecer por termos conhecido uma pessoa tão bacana, que gerou em nós um sentimento intenso e que nos fez companhia por um tempo razoável,um tempo feliz.

Como aliviar a dor do que não foi vivido? A resposta é simples como um verso: Se iludindo menos e vivendo mais!

A cada dia que vivo, mais me convenço de que o desperdício da vida está no amor que não damos, nas forças que não usamos, na prudência egoísta que nada arrisca, e que, esquivando-se do sofrimento, perdemos também a felicidade.

A dor é inevitável. O sofrimento é opcional...

Martha Medeiros

quarta-feira, 13 de fevereiro de 2019

Pequeno Anjo

Confesso: Ela não batia bem da cabeça
Eu acho que as mães são assim...
Ela ficava noite adentro cuidando de mim
Trabalhava sábado, domingo e feriado
Tudo isso para dar mais conforto para mim e meus irmãos.

Ela passou quase 9 meses
Com cólica, enjoos
Evitando comida gordurosa
Evitando esforço físico
Indo frequentemente ao médico
Cantarolando pra mim
Mesmo que eu ainda estivesse lá no ventre
Absorto e feliz, submerso no líquido aminótico
.
Ela não tinha medo
Enfrentava qualquer um
Ela morreria e mataria
Se alguém ousasse
ofender nossas vidas.

E toda vez que eu ficava doente
Ela dizia: "Por que em você, meu filho? Queria estar em seu lugar"
E aquilo era genuíno e ao mesmo tempo incompreensível
Como alguém pode querer estar doente no lugar do outro
Amor de mãe não tem igual.

Ela não era cantora profissional
Nem muito afinada
Mas era minha artista favorita (não fica com ciúmes pai)
Ela desenhava pra mim
Escrevia poesias
E sempre cantava com a voz de anjo
Carinhoso do Pixinguinha.

Esse era nosso hino
Ela sentava à beira
da cama e começava a cantarolar
"meu coração, não sei porque bate feliz quando te vê"
Essa é  a música mais linda do mundo
Ela olhava para mim como seu eu fosse um sonho, enquanto
segurava minhas mãos que delicadamente acariciava

Ela adorava Garota de Ipanema
e  Ballade pour Adeline nas mãos talentosas de Richard Clayderman , mas Tom Jobim e Paul de Senneville não eram páreos para Pixinguinha
Ela também gostava de Chico, Zé Ramalho, Fábio Júnior e Hinos da Harpa Cristã
Mas o cantor favorito dela era meu pai que amava música sertaneja de raiz.

Não é à toa que seu nome é Angelina
Significa pequeno anjo
Nome mais perfeito não poderia existir
De fato era uma mulher de pequena estatura
Mas de uma força e um coração que deixariam qualquer gigante intimidado
Ela foi meu anjo
Ela é meu anjo e sempre será.

Eu não queria escrever tudo isso
Eu precisava escrever tudo isso
Porque as palavras apenas tentam descrever algo
Me confortam
Me ajudam a traduzir um amor incomensurável
E uma saudade latente.

Eu te escrevo mãe,
mas eu queria mesmo era te abraçar
Te amo!

Roldan  Alencar

domingo, 13 de maio de 2018

QUOTIDIANO

Antes que você me corrija, adianto que a grafia do título está correta. Aliás, a grafia "cotidiano" também está correta. Agora vamos nos concentrar no tema. Quantos de nós já reclamamos, em algum momento da vida, que estamos cansados da nossa rotina. Cansados da mesma atividade diária, dos mesmos lugares e das mesmas pessoas. Seja honesto, você já se queixou alguma vez (ou várias). E isso é normal. Não é à toa que gostamos tanto de viajar (pelo menos muitos de nós). A mente precisa do novo. Isso não significa que precisamos endemonizar o quotidiano. Nossa vida acontece no dia a dia. Afinal, só em filmes os personagens vivem loucamente e está tudo bem. Na vida real, até os artistas e famosos precisam de quotidiano e sentem falta dele. Eles adoram viajar, interagir com o público, receber a energia dos fãs. Mas eles sentem falta da casa deles, da família deles, da cama deles. Ah, o lar. É um lugar tão especial. 

Não podemos esquecer que o quotidiano nos dá segurança, equilíbrio. E isso é fundamental no mundo maluco e tecnológico em que vivemos. Não saber para onde ir ou o que fazer no amanhã, pode parecer legal e desafiador. Mas imagine isso o tempo todo. Imagine a angústia que essa incerteza irá nos gerar, com certeza isso irá nos consumir aos poucos.  Acredito que o segredo está no equilíbrio (o que parece óbvio, mas não é). Precisamos sempre procurar o desenvolvimento pessoal, procurar novas coisas para fazer, novas habilidades, novas amizades. Mas sem jamais esquecer dos nossos princípios e principalmente daqueles que estão ao nosso lado. Não deixe um amor por outro, não deixe uma amizade por outra. É claro, se houver justo motivo, afasta-se de tudo aquilo que tira sua paz, não importa se é uma pessoa ou seu emprego. 

Falar em quotidiano é falar em felicidade, pois nossa vida acontece nele. E por isso, não podemos esquecer que a felicidade não está na chegada, pois ela é o próprio caminho. A felicidade não localizada no final de semana, no happy hour ou nas férias. Com certeza ela pode estar nesses lugares. Também pode ser encontrada num objeto ou situação. Mas essa felicidade é efêmera. Muitas vezes não é sequer alegria, tra-se apenas de euforia. Para ilustrar a ideia de caminho, imagine um alpinista que treinou anos e se esforçou muito para escalar o Monte Everest. Ao chegar no pé da montanha ele é, misteriosamente, teletransportado para o topo. Imagine a frustração dele ao saber que não escalou nada, ou seja, não participou do caminho. Você já reparou que muitas vezes nos divertimos mais na expectativa e nos preparativos de uma festa ou viagem, do que propriamente na viagem ou no evento?

A felicidade real está aqui, no agora. Está no quotidiano. Está dentro de nós. A sensação de uma vida com propósito está em cada fio que  tecemos diariamente. E será encontrada na casa que você está agora, no seu trabalho atual e com as pessoas que você ama. Se não gostamos de onde estamos e não mudamos, algo está extremamente errado. É preciso fixar raízes, mas não se estagnar. É preciso mudar, mas não o tempo todo. Desbrave o mundo e faça as mudanças necessárias. A pergunta que devemos refletir é: eu gosto do meu quotidiano? O que posso melhorar ? (sempre existe algo a melhorar). Posso acrescentar algo? Se não gosto de algo, o que estou fazendo para mudar isso?

Para chegarmos a essas respostas, o crescimento pessoal e espiritual deve ser uma constante (e não importa se você tem religião ou não). A razão (lógica) deve estar alinhada com os anseios da alma. Por isso é preciso evitar a lamúria,  ela é extremamente venenosa. Se não gostamos de algo devemos lutar para mudar. Por isso o conhecimento interior é imprescindível. Os gregos há milênios já diziam "conhece-te a ti mesmo e conhecerás todo o universo e os deuses, porque se o que procuras não achares primeiro dentro de ti mesmo, não acharás em lugar algum"*. Que possamos ter discernimento para saber o que mudar e coragem para fazer essa mudança. E por fim, que jamais nos esqueçamos: quem é grato no pouco, será grato no muito.

Namastê,

Roldan Alencar

*frase escrita no Templo de Delfos na Grécia.

sexta-feira, 11 de maio de 2018

SEJA INCIPIENTE
NÃO SEJA INSIPIENTE

De novo. Mais uma vez você com palavras homófonas? Exato. Incipiente é aquilo que é novo, aquele que é iniciante,  principiante. Não importa o que fazemos, sempre podemos evoluir e sempre podemos aprender coisas novas. O objetivo não é ser perfeito (do latim feito por completo), o objetivo é fazer aos poucos, mas fazer bem feito e sempre (nunca parar). A vida é tão linda, tanta coisa para fazer e conhecer, então a qualidade de incipiente é um convite para uma vida com mais cor, mais energia. 

De outra sorte, insipiente significa ignorante, aquele que desconhece algo ou deliberadamente, tendo a oportunidade, desdenha do novo. Não seja insipiente, não feche as portas da sua alma para o novo, para o diferente. Tenha raízes e não âncoras. A raiz alimenta, a âncora te impede de sair do lugar (zona de conforto - fuja dela). Não tenha medo de errar, aprenda com o erro e comece quantas vezes for necessário. Mas só recomece aquilo que alimente seu coração, não insista em caminhos tortuosos, caso contrário você será um incipiente insipiente. Não aprenda algo somente para agradar alguém, não seja um incipiente alienado. Não, por favor! Tenha propósito, objetivo. Como diria Sri Prem Baba: ação sem alma é passatempo. Faça com vontade. Seja um incipiente apaixonado pela vida, pois sempre haverá algo novo e incrível para aprender.

Namastê!

Roldan Alencar


p.s tire seus sonhos e projetos do papel. Não se ache velho ou incapaz para aprender um novo idioma, um instrumento musical, artesanato, culinária etc. Nunca se esqueça: "A vida é um muito curta pra ser pequena" ~ Benjamin Disraeli.

terça-feira, 5 de dezembro de 2017

Martha Medeiros: Feliz por nada

Geralmente, quando uma pessoa exclama Estou tão feliz!, é porque engatou um novo amor, conseguiu uma promoção, ganhou uma bolsa de estudos, perdeu os quilos que precisava ou algo do tipo. Há sempre um porquê. Eu costumo torcer para que essa felicidade dure um bom tempo, mas sei que as novidades envelhecem e que não é seguro se sentir feliz apenas por atingimento de metas. Muito melhor é ser feliz por nada.

Digamos: feliz porque maio recém começou e temos longos oito meses para fazer de 2010 um ano memorável. Feliz por estar com as dívidas pagas. Feliz porque alguém o elogiou. Feliz porque existe uma perspectiva de viagem daqui a alguns meses. Feliz porque você não magoou ninguém hoje. Feliz porque daqui a pouco será hora de dormir e não há lugar no mundo mais acolhedor do que sua cama.

Esquece. Mesmo sendo motivos prosaicos, isso ainda é ser feliz por muito.

Feliz por nada, nada mesmo?

Talvez passe pela total despreocupação com essa busca. Essa tal de felicidade inferniza. “Faça isso, faça aquilo”. A troco? Quem garante que todos chegam lá pelo mesmo caminho?

Particularmente, gosto de quem tem compromisso com a alegria, que procura relativizar as chatices diárias e se concentrar no que importa pra valer, e assim alivia o seu cotidiano e não atormenta o dos outros. Mas não estando alegre, é possível ser feliz também. Não estando “realizado”, também. Estando triste, felicíssimo igual. Porque felicidade é calma. Consciência. É ter talento para aturar o inevitável, é tirar algum proveito do imprevisto, é ficar debochadamente assombrado consigo próprio: como é que eu me meti nessa, como é que foi acontecer comigo? Pois é, são os efeitos colaterais de se estar vivo.

Benditos os que conseguem se deixar em paz. Os que não se cobram por não terem cumprido suas resoluções, que não se culpam por terem falhado, não se torturam por terem sido contraditórios, não se punem por não terem sido perfeitos. Apenas fazem o melhor que podem.

Se é para ser mestre em alguma coisa, então que sejamos mestres em nos libertar da patrulha do pensamento. De querer se adequar à sociedade e ao mesmo tempo ser livre. Adequação e liberdade simultaneamente? É uma senhora ambição. Demanda a energia de uma usina. Para que se consumir tanto?

A vida não é um questionário de Proust. Você não precisa ter que responder ao mundo quais são suas qualidades, sua cor preferida, seu prato favorito, que bicho seria. Que mania de se autoconhecer. Chega de se autoconhecer. Você é o que é, um imperfeito bem-intencionado e que muda de opinião sem a menor culpa.

Ser feliz por nada talvez seja isso.

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quarta-feira, 18 de maio de 2016

O Rubem sabe das coisas...

Como quase todo ser humano, ser pensante que sou, penso o tempo todo. Inclusive nas horas indevidas, como na hora de dormir, por exemplo. E hoje refleti sobre pessoas com mentes pequenas com ideias fixas, imutáveis. Já dizia Raul Seixas, eu prefiro ser essa metamorfose ambulante, do que ter aquela velha opinião formada sobre tudo.  Nessa esteira dizia o pensador Heráclito que ninguém toma banho duas vezes no mesmo rio, primeiro porque as águas já não são as mesmas e segundo porque a pessoa já não é a mesma. A cada dia somos uma nova versão de nós mesmos. Aquele que não se modifica envelhece. E este envelhecimento é na alma e não no corpo. Mas não podemos pensar pelos outros, isso é uma tarefa personalíssima. Cada um de nós deve olhar para si e também para fora, porque somos seres coletivos, plurais. É lógico que não devemos nos rebaixar perante os outros, mas aquela ideia de "tô nem aí para o que os outros pensam ou dizem" não é um dogma. Devemos sim ouvir e refletir. Muitas vezes são palavras ao vento outras vezes são indícios que não estamos no caminho certo. Para encerrar esta enxuta reflexão, coleciono uma frase de um dos meus pensadores e escritores favoritos - Rubem Alves.:



"Quem tenta ajudar uma borboleta a sair do casulo a mata.
 Quem tenta ajudar um broto a sair da semente o destrói. 
 Há certas coisas que não podem ser ajudadas.
 Tem que acontecer de dentro para fora."


Um grande abraço,


Roldan Alencar



Se você gostou deste texto, leia também: Felicidade e Caos

terça-feira, 19 de abril de 2016

A história do papel higiênico...

Você já se preocupou ou reparou na posição que é colocado o papel higiênico? Calma, vou explicar. O papel deve sair por cima ou por baixo? Parece um tema trivial, mas já deu até em divórcio. Por isso convido vocês a leitura da divertida crônica de Mário Prata:

O rolo do casamento


– Você coloca o papel higiênico – no rolo – com o papel saindo por cima ou por baixo?


O Kadu e a Bel se separaram. Pergunta você, que não sabe quem são os dois, e eu com isso?
O casal era o último da minha geração a manter os sagrados laços do matrimônio, a insistir na célula mater da sociedade. Mais de 20 anos, quase avós. Não acreditava quando me encontrei com o Kadu nos 40 anos da Élia, sábado passado.


– Mas o que houve, cara?
– Você não vai acreditar. A gente se separou por causa do rolo de papel higiênico... Pode?
– Como é que é? Bebeu?
– Sério. Foi quase litigioso.
– Calma, calma. Vamos por partes. Você e a Bel se separaram por causa de um rolo de papel higiênico?
– Um, não! Vários! Vinte anos de papel higiênico. Faça a conta.


Pirou, pensei. Ou está gozando com a minha cara.


– Você, por exemplo, quando coloca o papel higiênico no rolo, deixa o papel saindo por cima do rolo ou por baixo? Hein? Por cima ou por baixo?


Eu juro que nunca havia pensado nisso. Tentei lembrar do meu banheiro, da última vez que usei o rolo, nada. Por cima ou por baixo? Mal sabia, naquele momento, que o problema iria me acompanhar por toda a noite e, até hoje, não penso noutra coisa. Já ando fazendo pesquisas com amigos e amigas. Foi minha vez de perguntar:


– Você, por exemplo, põe por baixo ou por cima?
– Por baixo, é claro! Tem uma pesquisa nos Estados Unidos que constatou que a maioria do homens (71%) põe por baixo. E a maioria das mulheres põe por cima. Parece mentira, mas a pesquisa existe. Entrou no processo de divórcio. Já a USP nunca se manifestou.
– Mas vocês passaram a vida toda brigando por causa disso?
– Claro que não. Só os últimos cinco anos. Era um horror. Quando eu trocava o rolo, colocava por baixo. Quando voltava lá, estava por cima. Ela ia lá, de noite, e mudava. Bastava ela sair de casa que eu mudava de novo. A gente chegou num ponto em que estava quase partindo pra porrada! O casamento virou uma merda.
– Eu acho que eu ponho por baixo...
– O quê?
– Nada, nada. Mas o que ela alegava para colocar por cima?
– Uma tese frágil, foi o que o meu advogado defendeu. Ela dizia que, colocando por cima, quando você girava ele com força, a ponta sempre ficaria à disposição. E quando estava por baixo e você fazia o mesmo movimento a ponta sumia.
– Não deixa de ter a sua lógica a posição da Bel.
– Pô, cara, até você está contra mim? Tenho certeza que você coloca por baixo. Homem que é homem põe por baixo. O Junior, por exemplo, põe por baixo. Desde pequenininho. Faz parte da personalidade do homem. Vai por mim.
– Tudo bem, tudo bem. Mas se separar, depois de tantos anos, por isso? Por um rolo de papel higiênico?
– A gente tentou de tudo. Fomos fazer terapia de casal. A Madalena, que era a psicóloga, até sugeriu que a gente usasse folha dupla e soltasse uma por cima e uma por baixo. Mas embaralhava tudo. Ficava a maior confusão. A gente tentou de tudo. Mas, a cada dia, o problema aumentava. Começamos a discutir com os casais amigos, com vizinhos. Achavam que a gente estava louco. Cada vez era pior o problema. Eu voltava para casa pensando: aquela vaca virou o papel higiênico de novo! Sonhava com rolos e mais rolos de papel higiênico! Verdadeiros pesadelos. Antes que eu desse um tiro nela, ou ela em mim, veio a separação. Pensamos nas crianças, é claro. Cada um na sua casa, cada um com a ponta saindo como gosta. Ficamos até bons amigos. Fazemos o possível para não brigar mais. Mas eu não vou ao banheiro na casa dela – nem morto! – e ela não vai na minha. Na minha privada sento e mando eu! É o mínimo que um sujeito com a minha idade precisa para viver sozinho, feliz e sem problemas. Certo?


Fui para casa com o rolo na cabeça. Entro no banheiro, olho. Está saindo por cima, o danado! Coisa de mulher, me garantiu o Kadu. Pesquisa americana! Mudo, coloco por baixo. Vou dormir. Não consigo. Volto, coloco por cima. Fico olhando. Dou uma girada nele. Volto para o quarto. Pensando nele. Não consigo dormir. Volto ao banheiro. Olhando para ele. Tiro do lugar. Coloco em pé em cima do bidê e vou dormir em paz. Amanhã eu resolvo este problema. Afinal, ainda falta uma semana pra Renata voltar de férias.


Mário Prata



"Posso ser leve como uma brisa ou forte como uma ventania,
Depende de quando e como você me vê passar."

Clarice Lispector